sexta-feira, 3 de abril de 2009

Criado para criar

O Pai coçou a cabeça e seu rosto expressava algo como se tivesse chupado limão e não gostou. Havia à sua frente uma imagem de barro. Um esboço, na verdade. Havia algo esquisito. Se afastou e repensou em tudo, de olho naquela coisa. Repassava os detalhes por detalhes. Achou que pensou bem quando quis moldar tal criatura de joelhos - "Afinal esta coisa tem que me adorar! Mas como os braços tinham que ficar? Deste jeito não dá." - Não tinha gostado daquela posição.

Ainda de longe (pois a distância mostra o todo melhor que de perto) aquele projeto parecia um toco de madeira fincado no chão. Decididamente pensou que se tinha que criar algo pra adorá-lo, que fosse algo importante e não um poste esperando um cachorro vir mijá-lo.

Descartou de início a idéia de colocar os braços em posição de súplica. - "Coisa de gente fresca!" - Então piscou com o olho esquerdo e a imagem magicamente foi remodelada, ficando em pé. Os braços cuidadosamente esticaram-se, como no Cristo Redentor Carioca (é só pra vocês terem uma idéia de como tinha ficado. Aliás, naquela época "O Cristo" existia, e não ainda "O Redentor"). Assim ficava mais fácil pra pensar o que fazia com os braços antes de colocar o barro no forno.

Quando ele olhou para aquela escultura em pé, de braços abertos, ficou hipnotizado. Num ímpeto, imitou a escultura abrindo Seus braços também. E numa força inexplicável os corpos se atraíram. Quando os corpos ficaram bem próximos, os braços do Pai caíram exaustos sob as costas da criação, afinal já tinha feito o mundo todo em seis dias, estava cansado e emocionado com o espetáculo de como tudo tinha ficado. O Pai suspirou forte e soltou o ar pelas narinas.

Depois de uns minutinhos (não sei o tempo exato, só sei que a criação toda parou para assistir aquela cena), o Pai sentiu uma sensação afável de algo apertando-O. Sentia mais próximo da criação - corpo a corpo. Quando se deu conta, estava repetindo o mesmo movimento que a 'escultura' fazia. Os telespectadores ficaram perplexos ao saberem que o ar de Suas narinas dava vida as coisas. Mas, na verdade, poucos sabem disto. O culpado de tudo foi o amor junto com a emoção de dar a vida. O poder de um verdadeiro abraço. O Grandioso Pai percebeu que a sua criação superou suas expectativas e até hoje nutre um amor imensurável por ela.

- Escrevi este conto baseado no poema da minha nova amiga Poliana Rodrigues Castro;

Os Laços
Link: http://devaneiosimportantissimos.blogspot.com/2009/04/os-lacos.html

Leiam, graciosíssimo.

TARCÍSIO MARCHIORI JUNIOR

2 comentários:

  1. Sinto-me estasiada com sua criação, e feliz que meu poema tenha lhe proporcionado inspiração.
    Obrigada e Bjs de sua amiga.

    ResponderExcluir
  2. Existem coisas na vida que nos frustram. E não tem como não acontecer.
    .
    Abraçar o travesseiro é uma delas!

    ResponderExcluir